Segundo o site https://www.folhape.com.br/noticias: 2023 tem sido marcado por ondas de calor e incêndios em todo o mundo numa era que foi nomeada "fervura global"
O inverno no Brasil vai terminar com o início de uma onda de calor brutal, que tomará quase todo o país e ameaça quebrar recordes devido à extensão, à intensidade e à duração previstas.
As temperaturas sobem ainda mais a partir desta quarta-feira (20). Um domo quente, uma área de alta pressão atmosférica de tamanho e intensidade colossais, levará a temperatura para acima dos 40ºC em cerca de um terço do solo brasileiro.
Julho de 2023 quebrou amplamente o recorde do mês mais quente registrado na Terra, com 0,33 grau Celsius a mais que o recorde anterior de julho de 2019, anunciou o observatório europeu Copernicus. Diante dos recordes de temperatura em todo o mundo, o desafio passa a ser antecipar os limites do tempo extremo: afinal, quanto de calor e umidade o corpo humano pode suportar?
O termo científico internacional para medir essa capacidade de resistência é o "Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo (IBUTG)" ("Wet Bulb Globe Temperature" - WBGT em inglês), que combina o cálculo do calor com o grau de umidade.
O "bulbo" é o depósito de mercúrio de um termômetro tradicional, envolto em um pano úmido, cuja evaporação serve para medir a temperatura úmida do ar. Já o "globo" é uma esfera oca pintada de preto que, presa a um termômetro, serve para medir a radiação térmica.
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Especialistas calculam, em média, que um jovem perfeitamente saudável morrerá dentro de seis horas após a exposição a uma temperatura IBUTG de 35 graus Celsius. Essa temperatura equivale a 35 graus de calor seco e 100% de umidade, ou 46 graus com 50% de umidade. Nesse ponto crítico, o suor, a principal ferramenta do corpo para baixar a temperatura central, não consegue evaporar da pele, o que eventualmente leva à insolação, ao colapso dos órgãos internos e à morte.
Um IBUTG de 35 graus foi atingido apenas algumas vezes, principalmente no sul da Ásia e no Golfo Pérsico, disse à AFP Colin Raymond, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa.
Nenhum desses casos durou mais de duas horas, o que significa que nunca houve "fenômenos de mortalidade em massa" vinculados a esse limite de sobrevivência humana, disse Raymond, autor de um grande estudo sobre o assunto.
Mas o calor extremo não precisa chegar nem perto desse nível para matar uma pessoa. Episódios mais comuns
Na verdade, todo mundo tem um limite diferente com base em sua idade, saúde e outros fatores sociais e econômicos, dizem os especialistas. Por exemplo, estima-se que mais de 61 mil pessoas morreram devido ao calor do verão passado na Europa (inverno no Brasil), onde raramente há umidade suficiente para criar perigosas "temperaturas de bulbo úmido".
Mas à medida que as temperaturas continuam subindo (julho foi o mais quente já registrado), os cientistas alertam que os episódios de IBUTG também se tornarão mais comuns. A frequência desses eventos no mínimo dobrou nos últimos 40 anos, explica Raymond, que considera esse aumento uma consequência grave da mudança climática causada pelos humanos.
Raymond calcula que as temperaturas de bulbo úmido "excederão regularmente" os 35 graus em várias partes do mundo nas próximas décadas se o mundo aquecer 2,5 graus acima dos níveis pré-industriais.
Para testar esse limite, pesquisadores da Universidade Pública da Pensilvânia mediram as temperaturas centrais de pessoas jovens e saudáveis dentro de uma câmara térmica. Os participantes atingiram seu "limite ambiental crítico" quando seus corpos não conseguiram evitar que sua temperatura central subisse ainda mais, a um IBUTG de 30,6 graus. Joy Monteiro, um pesquisador na Índia que no mês passado publicou um estudo na "Nature" analisando as temperaturas de bulbo úmido no sul da Ásia, disse que a maioria das ondas de calor mortais da região estava bem abaixo do limite teórico de 35 graus.
A resistência humana a essas temperaturas é "tremendamente diferente dependendo de cada pessoa", disse à AFP.
Idosos são os mais vulneráveis
As crianças pequenas são menos capazes de regular a temperatura corporal, portanto estão em maior risco, disse Ayesha Kadir, pediatra do Reino Unido e consultora de saúde da Save the Children. Mas são os idosos, que têm menos glândulas sudoríparas, os mais vulneráveis. Quase 90% das mortes relacionadas ao calor na Europa no verão passado ocorreram entre pessoas com 65 anos ou mais. As pessoas que precisam trabalhar ao ar livre em altas temperaturas também correm maior risco.
Joy Monteiro observa que as pessoas sem acesso a banheiros costumam beber menos água, o que provoca desidratação. Sua pesquisa mostrou que o fenômeno climático El Niño elevou o IBUTG no passado. O atual El Niño, o primeiro em quatro anos, deve atingir o pico no final deste ano. As temperaturas de bulbo úmido também estão intimamente relacionadas às temperaturas da superfície do oceano, disse Raymond. Os oceanos do mundo atingiram a temperatura máxima histórica na semana passada, superando o recorde anterior de 2016, de acordo com o observatório climático da União Europeia.
Julho de 2023, o mês mais quente da História
O mês de julho foi marcado por ondas de calor e incêndios em todo o mundo, com temperaturas médias na atmosfera 0,72 grau acima das médias recentes de julho entre 1991 e 2020.
Nas palavras do secretário-geral da ONU, António Guterres, a humanidade saiu da era do aquecimento global para entrar na da “fervura global”.
Os oceanos também são vítimas deste fenómeno preocupante: as temperaturas registradas à superfície do mar são anormalmente elevadas desde abril, e os níveis registrados em julho são inéditos.
O recorde absoluto foi quebrado em 30 de julho, com 20,96 graus. Ao longo do mês, a temperatura da superfície do mar ficou 0,51 grau acima da média (1991-2020).
Sinais do aquecimento global causado por atividades humanas - a começar pelo uso de combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás) - surgiram simultaneamente em todo o mundo.
A rede científica World Weather Attribution (WWA) já concluiu que as recentes ondas de calor na Europa e nos Estados Unidos teriam sido "virtualmente impossíveis" sem o efeito da atividade humana.
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